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Com ou sem crise, uma das maiores dificuldades dos pequenos empresários no Brasil sempre foi estabelecer os preços de seus produtos ou serviços.

A prática mais comum é mirar a concorrência e, a partir daí, colocar um valor semelhante ou um pouco maior ou menor do que a média de mercado.

Com custos em alta e vendas em queda, cenário vivido há mais de um ano no país, está mais do que na hora de abolir este costume.

A afirmação é de Lúcia Amélia Gomes, consultora do Sebrae SP. “Quase todos os empresários, com raras exceções, não sabem colocar preços nos seus produtos”, afirma.

Com a pandemia, diz ela, ficou mais evidente a necessidade de os empreendedores não errarem mais neste quesito, essencial para a sobrevivência do negócio.

É obvio, de acordo com a consultora, que qualquer empreendedor precisa sempre ficar de olho no que faz a concorrência.

Mas o olhar para dentro da empresa é tão ou mais importante do que somente mirar o que está ocorrendo mundo afora.

CUSTOS E LUCRO

  • O preço de venda de um produto precisa cobrir os custos fixos e variáveis e ainda gerar lucro para o empreendedor.
  • Os custos fixos são aqueles que não vão aumentar ou diminuir conforme as vendas, como salários, aluguel, despesas com contador, materiais de escritório e limpeza.
  • Os custos variáveis são aqueles que aumentam conforme as vendas, como comissões para os empregados, impostos sobre as vendas, taxas para uso de cartões.
  • No custo variável também entram as matérias-primas que, neste momento, por conta da pandemia, sofrem forte pressão de alta.
  • E a margem de lucro, bem mais apertada também em razão da pandemia, de acordo com Amélia Gomes, precisa gerar sobras para capital de giro, investimentos.

“Comprar por 100 e vender por 200”

O fundador da rede Casas Bahia, Samuel Klein, falecido em 2014, costumava dizer que o segredo do seu negócio era comprar por 100 e vender por 200, simples assim.

“Pode ser que, no passado, esta prática tenha dado certo, mas agora, não mais”, afirma a consultora.

Há quatro anos, Jorge Ferreira da Silva Jr, 36 anos, abriu uma hamburgueria, a Quintal Burger 375, em Guaianases, na zona Leste de São Paulo.

Na época, vendia o sanduíche com pão, carne, queijo e molho de maionese por R$ 16. A referência eram os preços médios cobrados pela rede McDonald´s nas redondezas.

“Com a pandemia, precisei entender muito melhor do meu negócio, como a formação de preços do meu hambúrguer artesanal”, diz ele.

Hoje, com a orientação de consultores do Sebrae SP, ele sabe exatamente o custo de cada um dos sete diferentes sanduíches que comercializa.

O sanduíche, que custava R$ 16, agora custa R$ 24. O mais caro, com dois hambúrgueres de 150 gramas e bacon, sai por R$ 50.

“Eu praticamente pagava para trabalhar, com lucro zero. Hoje não perco mais dinheiro. Alguns sanduíches possuem margens maiores. Outros, menores.”

Para atrair a clientela, e somente pelo sistema de delivery, ele vende um sanduíche, o Smash, por R$ 20. Com batata e refrigerante, o combo sai por R$ 27,90.

 

Na ponta do lápis

 

Ferreira da Silva Jr detalhou a ficha técnica do hambúrguer de R$ 24 para exemplificar como é importante para o dono do negócio ter tudo na ponta do lápis.

A carne (150 gramas) sai por R$ 4,50. O pão, por R$ 1,06. O queijo (35 gramas), por R$ 0,90. O molho (30 gramas), por R$ 0,39.

Total: R$ 6,85, valor que representa cerca de 28% do preço de venda do sanduíche. Os outros 62% correspondem aos custos fixos e variáveis e margem.

“É esta visão que o empreendedor precisa ter na hora de formar o seu preço”, afirma.

Um empreendedor que não sabe estabelecer preço, diz ele, é o mesmo que estar dirigindo um carro na chuva sem uso de para-brisas. Isto é, não vai enxergar nada.

Fernando Denardi, sócio-proprietário da hamburgueria Terra Japi, em Jundiaí (SP), abriu o negócio há quatro meses com a ficha técnica de cada produto que vende.

“Se você não sabe colocar preço nos produtos, provavelmente, não vai conseguir pagar as contas nem ter lucro no negócio”, afirma ele, que é chefe de cozinha.

Pelo sistema de delivery, os preços dos seus sanduíches, que levam os nomes os bairros que circundam a região da Serra do Japi, variam de R$ 15,90 a R$ 34,90.

No restaurante, os preços vão de R$ 20 a R$ 36. Nesta semana, ele está trabalhando no preço de seu novo lançamento, o sanduíche Tulipas.

O peso e custo de cada ingrediente – queijo gouda, tomate cereja, cebola roxa, folha de manjericão, maionese de alho e pão ciabatta – já estão listados na planilha.

“É um sanduíche que deve custar entre R$ 32 e R$ 35”, diz Denardi.

Amélia Gomes diz que, além de saber formar preço, o empreendedor precisa se posicionar no mercado, oferecendo valor, benefício para os clientes.

Se oferecer algo mais do que a concorrência, de acordo com ela, o empresário pode ter preço de venda até superior ao de mercado.

DICAS

  • Não adianta ter um preço que cobre todos os custos, mas chegar à conclusão que o mercado não absorve aquele valor.
  • “Preço é o que você cobra. Valor é o que você entrega”, afirma Amélia Gomes.

O empreendedor também precisa ficar atento em uma situação contrária, isto é, quando o seu preço está abaixo do da concorrência.

Essa é uma situação, de acordo com a consultora, que pode levar o cliente a achar que aquele produto não é bom.

Ela dá um exemplo. Existe hoje no mercado muitas empresas que vendem os chamados marmitex por R$ 12.

Se cobrar R$ 10, a empresa pode passar a impressão de que as matérias-primas que utiliza no preparo da comida são inferiores.

“O preço de venda é, portanto, muito estratégico para qualquer negócio. Por isso, o empresário tem que dedicar tempo a ele.”

  • Outra dica para enfrentar a pressão de custos e a queda de poder aquisitivo do consumidor é a busca de alternativas.

“No caso de uma hamburgueria, uma opção é a redução da porção de batata fritas, por exemplo, ou a troca de algum ingrediente na receita.”

A expressão “em time que ganha não se mexe”, diz ela, não vale para o empreendedor.

  • Muitas vezes, diz a consultora, é preciso mexer sim na estrutura do negócio para cobrir custos e ainda ter lucro com a operação.

 

Conteúdo por: Fátima Fernandes/Diário do Comércio